Escrita: manual X digital (parte 2 de 2)
Continuação do arigo "Escrita: manual X digital (parte 1 de 2)",
que contastava os seguintes tópicos:
A) Introdução
B) A Escrita
C) Os Sistemas de Escrita
D) Usos e Empréstimos
E) Dominação e Influências
Antes da imprensa, das máquinas de datilografar e dos computadores e celulares, todos os textos eram escritos à mão. Nos tempos atuais isto soa quase inacreditável, tanto quanto fazer contas de cabeça, sem calculadoras ou planilhas.
Enquanto copistas em mosteiros reproduziam livros e pergaminhos, copiando letra a letra, uma por uma, na Europa Medieval, os árabes expandiam seus domínios pela Ásia, norte da África e Península Ibérica, onde influenciaram enormente a cultura literária européia (nosso berço).
Na conquista árabe, diferentemente da grega - que tolerava -, da romana - que impunha -, da católica - que eliminava -, os muçulmanos preservavam, absorviam e se aproveitavam do que encontravam de bom nas outras culturas que subjugavam.
Assim, construiam bibliotecas, colecionavam livros e conhecimentos de vários povos. Trouxeram para o ocidente os algarismos tomados emprestados da Índia e isto viabilizou a evolução da matemática. Trouxeram a bússola e a pólvora, que impulsionaram o expansionismo marítimo europeu, que transformou o mundo em globo. E fundaram a primeira universidade na Europa, em Granada, Espanha. Isto trouxe luz à Idade Média.
F) A Arte de Escrever
A escrita manual com letras romanas é uma tarefa relativamente demorada, e cada caracter exige uma certa quantidade de traços. Isto é ainda mais complicado nas escritas chinesa.
O desenho das letras árabes foi projetado para que estas se interligassem, de modo que uma palavra pudesse ser escrita quase que num só traço, sem tirar a pena (o lápis ou caneta ou pincel) da superfície (papel, painel, parede, tábua).
Isto dá um estilo harmônico à escrita, muito agradável de se ver. Há artes belíssimas, imagens compostas de frases e palavras árabes.
E, o mais importante: propicia uma maneira muito mais rápida de escrever!
Estas características - harmonia e beleza estética, velocidade e praticidade - chamaram a atenção dos escribas (ou escrivães) europeus, que adaptaram as letras latinas num alfabeto cursivo, também chamado de "letra corrida".
Este modo de escrever passou a ter muitos adeptos, e a ser ensinado em cursos que procuravam tornar a escrita mais bonita ainda. Foi chamada de Caligrafia (do grego: cali = bonita, bom + graphos = escrita).
G) Profissão Escritor
Saber escrever cursivo e rapidamente não é sinônimo de escrita legível. Exige coordenação motora nas mãos e dedos, técnica, estilo, paciência e senso estético.
Cada um acaba tendo sua própria letra, ou caligrafia, não necessariamente bonita. Em muitos casos pareceem verdadeiros garranchos, ilegíveis. Algumas pessoas que aprendem ambos os estilos, às vezes optam pelas letras de fôrma, para permitir maior legibilidade de seus textos por outros (até por si mesmo!). (*5)
Por ser uma tarefa e uma habilidade que exige aprendizado, ao longo da história dos povos, os poucos que sabiam escrever ocuparam posição de destaque e privilegiada na sociedade e perante seus governos, que precisavam de quem documentasse oficialmente seus feitos e conquistas, e registrassem suas posses e leis.
A história era feita por todos, protagonizada por alguns, mas transcrita por poucos.
H) Escrita Popular Moderna
A popularização da escrita e a abrangência desta arte acessível a todos é relativamente recente, coisa de 200 anos pra cá (o que é muito pouco tempo em mais de 5 mil anos de história escrita).
Isto significa que, se cada geração ocorre em 30 anos em média, os avós de nossos bisavós eram praticamente analfabetos, mal liam e não sabiam escrever, com raras exceções.
Atualmente quase todos vão à escola, onde aprendem ler e escrever. Pelo menos, teoricamente. Na prática, esse aprendizado se dá em casa e no exercício mediante a necessidade. Mas é inegável a quantidade de pessoas capazes de escrever, bem ou mal, nos dias de hoje.
No século passado, a máquina de escrever, ou de datilografar, era uma facilidade que nos livrava dos garranchos e letras mesquinhas. E se tornou muito popular, por causa disto. Arrumava melhor emprego quem soubesse datilografar e bem...
A evolução tecnológica permitiu a máquina de escrever eletrônica, que trocava tipos de letra para sofisticar o estilo, armazenava algum texto em memória ou visor, que facilitava alinhamentos e correções antes de passar para o papel, poupando papel e retrabalho.
Mas este progresso não durou muito... Pois foi logo substituída por outro ferramental ainda mais poderoso: o microcomputador pessoal, vulgo PC (do inglês, Personal Computer). Nos dias atuais é cada vez maior a quantidade de gente que tenha um ou tem acesso aos PCs.
Até vários modelos de telefones celulares permitem seus usuários escrever textos com eles, e mandar para alguém ou imprimir.
I) A Extinção da Caligrafia?
Com tantas facilidades tecnológicas, estará a escrita manual fadada ao desuso? É o que dão a entender certos analistas de tendências.
De fato, teclados portáteis ou de mesa são muito mais eficientes nas pontas dos dedos (daí o termo "digital") do que papel e lápis ou caneta.
Mas... E se faltar a energia elétrica ou acabar a bateria ou pilhas? Como vai escrever? Solução: na mão! Do digital para manual!
Este pequeno detalhe, da total dependência energêtica seria argumento suficiente para se continuar a ensinar escrita manual nas escolas. (*6)
Depois, tem toda a bagagem histórica da coleção de cartas e documentos, às vezes diários e livros inteiros, escritos assim e que precisam ser lidos e entendidos, para se resgatar memória e História.
A grafologia (*7) pode nem ser ciência exata, mas incontestavelmente a caligrafia de cada um é sua marca pessoal.
J) Conclusão (*8)
Neste mundo sempre teremos pontos-de-vista diferentes e divergentes sobre qualquer coisa. Não é da natureza humana concordar com tudo nem com todos. O pensamento e a alma livres, além da criação, motivação e circunstâncias variadas, permitem que as pessoas divirjam sobre os assuntos, buscando argumentos e meios que justifiquem o que é de seu interesse.
Mas muitas vezes alguns se apegam a raciocínios ofuscados e lógicas distorcidas, muitas vezes omitindo certos aspectos e desconsiderando vários fatores, para prevalecer sua razão.
Não sei que interesses haveria por trás desses especialistas visionários, suportados pelos políticos legisladores, que decretam a morte do ensino da escrita manual nas escolas dos Estados Unidos, alegando tendências da modernidade... Desconfio de motivações financeiras e dominação política, porém nada posso afirmar sem evidências.
Mas espero sinceramente que essa onda absurda não invada a praia do nosso saber e patrimônio cultural da humanidade.
Quero crer que as boas escolas continuem a ensinar o que é bom para a formação das pessoas.
Que uma idéia de futurologia não atropele o presente nem apague o precioso passado!
Afinal, a Escrita anda junto de mãos dadas com a História, feita pelas mãos humanas.
Notas:
(*5 Os formulários pedem para serem preenchidso com letras de forma, para melhor legibilidade, mas principalmente para permitir digitação correspondente das informações em campos limitados nos computadores)
(*6 Pelo mesmo motivo, em nome da independência energética, a aritmética e tabuada devem ser sempre ensinadas e aprendidas pelas pessoas. Apesar de calculadoras, computadores e celulares fazer contas por nós, todos precisam saber fazer contas de cabeça ou no papel e na ponta do lápis)
(*7 A grafologia, do grego graphos=letra + logos=conhecimento, estuda personalidade das pessoas a partir de análise da forma de escrever. )
(*8 Opinião nada conclusiva)
(* Gostaria de saber sua opinião sobre a quebra deste artigo em dois posts. Prefere um único artigo longo e completo, ou em duas partes menores? Obrigado)
Eu ainda gosto dos blogs
Há um mês
9 comentários:
Oi, André. Parabéns e obrigado pelos dois excelentes artigos sobre a trajetória da escrita na humanidade. Conhecimento é tudo, eu acho. Quanto à sua pergunta final, minha opinião é que ficu melhor assim. Dada a quantidade de informações , se fosse num só artigo poderia dispersá-las e cansar mais. Ler no monitor ainda é algo mais cansativo de que ler em papel.(pelo menos para a minha idade. rsrs). Abração , paz e bem.
Parabéns, ficou legal assim ...
Beijo, abraço e um sorriso largo!
Lembrei das minhas aulas de Taquigrafia...Ando enferrujada.
Um beijo.
Hummm... Que aula, hein!!
Você dá aula de que, mesmo???
hehehe
Eu achei ótimo assim, dividido em duas postagens, estilo "cenas dos próximos capítulos"... rsrs... pois é, sou desse tempo!!
Ainda hoje, no primeiro ano do ensino fundamental, os pais se mostram ansiosos para que seus filhos aprendam logo a letra cursiva. Quando me perguntam o que penso disso, digo a eles que muitas vezes, antigamente, as crianças aprendiam a copiar em letra cursiva, mas não aprendiam a ler e escrever. Tornavam-se copistas. Que hoje prefere-se ensinar a letra "caixa alta" (a famosa letra de forma), para que a criança entenda cada letra, o papel de cada uma na palavra, que entenda o que está lendo e escrevendo. Depois, ensina-se a letra cursiva e a boa caligrafia, que eu considero muito importante, sim! Isso é minha opinião e o que digo a eles. Mas tenho visto muitos professores dizerem aos pais: "Não se preocupe com letra cursiva, não se usa cursiva pra nada hoje em dia. Futuramente nem usaremos letra cursiva mais!"...
Da mesma forma que digo aos pais que as crianças precisam aprender a escrever (falando de caligrafia mesmo), também digo que precisam, sim, aprender a tabuada! Sempre trabalho com meus alunos o processo, para que entendam o que estão fazendo, faço um trabalho bacana com calculadora... Mas decorar (e é decorar mesmo, não precisamos ter vergonha nem medo de usar o termo) a tabuada é essencial!
E, olha...
Eu amo receber bilhetes porque são escritos à mão...
E amo quando o carteiro me entrega um envelope e eu vejo que é uma carta escrita à mão... amo mesmo!
^^
Beijos!!
A sua postagem em duas etapas ficou
muito boa. Muito bem explicada.
bjs
André,
Não pretendo viver num mundo sem escrita cursiva, espero morrer antes. Abraços, JAIR.
Martin! Martin!
Vou ser super sincera contigo. São quase 3h da madrugada... não consigo ler teu post (considerando que é a parte 2, portanto vou ter que ler a 1), e conseguir assimilar de forma adequada..., então para não dizer que não vim aqui para nada, além de te dizer que você também fica bem na foto, e obrigada, seguinte... vou comentar sobre o outro post neste (não fica brabo!)... não ficou? Então tá:
A arte da fotografia pode compor a fotografia da arte..., mas a fotografia da arte, nem sempre é a arte da fotografia, ela pode ser uma mera fotografia da arte, onde só existe a arte a ser fotografada. Portanto o que vale mais é a arte da fotografia.
Não ficou brabo?
Não?
Tudo ok?
Beijinho e ótima semana.
Martin....
Não fica com essa cara...
Volto e leio com calma os dois posts, até porque é de minha área de trabalho, e também porque você organizou com todo cuidado. Merece, tá bom?
Beijoss
Parabéns pelo artigo e pelo interesse pela caligrafia.
Realmente é muito mais prático e eficiente escrever no computador.
Eu, programador, passo o dia todo nele há décadas e sei bem de sua importância.
Mas sei também que não deveríamos nos deslumbrar tanto com a tecnologia, com a eficiência, com a velocidade.
Precisamos recuperar a calma, a ineficiência que nos ajuda na beleza, a lerdeza que nos possibilita apreciar a paisagem.
Estou praticando, após muitos anos, a caligrafia. Até comprei canetas tinteiro.
É uma maravilha e um prazer podermos simplesmente dedicar tempo para caprichar num traço.
Será que nossos educadores e jovens irão saber o que é isso?
Abraços
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