terça-feira, 4 de outubro de 2011

Leitura social

(Quero compartilhar aqui uma história que ouvi e que me deixou bastante comovido)


Robson Mendonça foi morador de rua por 6 anos. Segundo ele conta, tornou-se um depois de ter sido seqüestrado e jogado na rua sem dinheiro e documentos, assim ficou e passou necessidades, fome e frio em São Paulo.

Ele não era muito instruído, mas era curioso: gostava ler notícias, revistas e alguns livros com histórias. E para isto procurava a biblioteca municipal a as públicas. Mas quando sentava à mesa para ler, as pessoas que estavam perto se levantavam e se afastavam, por causa da má impressão que ele causava por ser morador de rua, como estava vestido e cheirava, e de todos os seus pertences que era obrigado a carregar aonde fosse, em sacolas ou mochila.

Essa reação das pessoas o incomodava, mas ele entendia. Todavia, não tinha como retirar livros para levar e ler fora da biblioteca, porque a biblioteca exige comprovante de residência para fazer o cadastro, o que um morador de rua obviamente não tem.

Ele decidiu então que se saísse das ruas e melhorasse de vida, faria o que estivesse ao seu alcance para mudar essa condição e tentar dar acesso mais fácil à leitura a outros moradores de rua, situação que ele viveu e conheceu bem. Segundo ele mesmo conta, foi depois de ler A Revolução dos Bichos que ele acreditou que isso seria possível. E foi.

Deixou a condição de morador de rua há mais de 8 anos. Robson Mendonça virou Presidente do Movimento Estadual de População em Situação de Rua. Queria fazer uma biblioteca móvel, uma bicicleta com baú na garupa, com a idéia de oferecer livros pela cidade a quem quisesse ler. Nascia assim a Bicicloteca. E uma fundação/ONG, Instituto de Mobilidade Verde, ajudou-o a tornar esse sonho em algo mais concreto, doando a bicicloteca e alguns livros.


Ele então ia pelo centro, praças e cantos da cidade, oferecendo livros a quem quisesse, não só a moradores de rua, entre bêbados e drogados, mas também a funcionários públicos, de bares e restaurantes, vendedores ambulantes, camelôs, policiais, estudantes, a quem passasse e se interessasse.

A idéia era que os livros retirados circulassem depois entre outros leitores, sem expectativa da devolução. Mas muitos devolviam aqueles, para retirar outros. Dos 4 mil livros que foram distribuídos, houve retorno de mais de 3800 para serem reemprestados. Em média saíam quase 200 livros por dia...

O sucesso da iniciativa e atuação foi tamanho que ele virou foco de várias reportagens. Neste mês, ele foi convidado para participar de um programa de estudantes da TV USP, quando aconteceu um incidente lamentável.

No dia 21 de setembro ele foi entrevistado, e o pessoal do programa quis entrevistar também um pessoal da rua, ver como viviam seus leitores. Depois de entrevistarem algumas pessoas na rua, Robson precisou ir ao banheiro, e pediu para a equipe da TV para olharem a bicicloteca. Quando voltou, ela havia sumido! Roubada, furtada.

Por um breve momento, um bem sem muito valor financeiro, mas de enorme importância para um bem social, foi levado por alguém que nem deve ter consciência disto.

Um vacilo, um excesso de confiança, um descaso, um descuido, um infortúnio. Foi isto que aconteceu. Enquanto Robson foi fazer suas necessidades fisiológicas, acreditou que alguém tomaria conta da bicicloteca. A equipe, que viu naquela hora outra oportunidade de entrevistar um grupo que estava ali adiante, não acreditou que alguém fosse mexer naquela bicicloteca. E um dos entrevistados da rua, sei lá o que pensou, mas deve ter acreditado que com aquilo poderia levantar algum dinheiro...

Robson Mendonça fez cartazes com uma foto do suspeito, cedida pela reportagem, e procura pela cidade se reencontra sua bicicloteca, distribuindo cartazes, fez um apelo na rádio, se alguém vir uma bicicloteca por aí, para entrar em contato. São Paulo é enorme, e seu tempo não...

Seu desespero nem é pelo valor da bicicleta e dos quase 200 livros que foram subtraídos. E sim pelo trabalho nobre interrompido. A alegria que via nos olhos e no coração de quem ficava com um livro para ler. E drogados e bêbados que querem ler, não podem estar neste estado para fazê-lo: têm que parar de beber ou de se drogar, pelo menos enquanto lêem um livro ou outra coisa. Só essa atitude já faz valer e ter sentido o projeto da bicicloteca, além da divulgação e inclusão da cultura nos meios mais carentes da sociedade.

Que achem a bicicloteca! Que outras sejam doadas! Que outros voluntários se comprometam e dediquem a esta simples e nobre proposta! Que Robson Mendonça tenha mais sucesso e sorte no seu empreendimento, desprendimento e dedicação!




Vídeos reportagem:

Ex-morador de rua monta biblioteca móvel para a população carente
http://www.youtube.com/watch?NR=1&v=ZHOJmWmWrMo


Canal da bicicloteca no YouTube (com mais videos)
http://www.youtube.com/user/bicicloteca#p/a/u/1/h4HAU2KPqdg


Sobre o roubo da bicicloteca no dia 21/Setembro/2011
http://www.youtube.com/watch?v=0u9dL-TG20w



Sites de referência:

Reportagem Folha.com
http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/950367-bicicloteca-empresta-livros-para-moradores-de-rua-em-sp.shtml

Sobre o que é o projeto Bicicloteca
http://biciclotecas.wordpress.com/
http://www.biciclo.teca.nom.br/
http://institutomobilidadeverde.wordpress.com/bicicloteca/


11 comentários:

Caca disse...

E não é só você quem ficou comovido. Caramba, que absurdo! Acho que eu até seria menos impulsivo com um roubo de uma bicicleta comum, mas esta não! Ela é uma instituição cultural das mais fecundas e promissoras. Tomara que depois de tanta divulgação ela reaparecça. Abraços, André. Paz e bem.

Luna Sanchez disse...

De forma breve : que cara admirável!

E essa bicicleta tem que reaparecer!!!

=*

:.tossan® disse...

Pois é meu amigo, e outros que podem comprar livros nem entram e passam perto de uma livraria...E assim caminham os blefes da vida! Bela reportagem e mais ainda a ideia da edição. Abraço

mfc disse...

Um sucesso que só a solidariedade permite!

MA FERREIRA disse...

Oi André..
Poxa..fiquei comovida com esta noticia.
Primeiro pelo exemplo de ser humano que se superou através dos livros.]Sefundo a sua atitude de compartilhar.
E terceiro, pelo roubo.
Caramba!!
Acho que quem roubou não tinha a minima noção do que estava fazendo.
Será que ele achou a bicicleta? Será que alguma alma fez uma doação de uma bicicleta?

Bacana e triste seu post.
Bacana por divulgar po lado bom da historia..e triste pelo acontecido!!
bj

Ivana disse...

Oi André,
Obrigada pela visita e se puder voltar para ver a homenagem que fiz para Amapola está um pouquinho mais abaixo. Que história comovente! Não se deve roubar nada, mas essa bicicleta não poderia ser roubada de jeito nenhum, que mundo vivemos. Um forte abraço!

Elisa T. Campos disse...

Oi André

Que comovente história com final triste que esperamos que reverta em breve.

bjs

JAIRCLOPES disse...

André,
Que história de vida de Robson! E que infelicidade lhe acometeu. Fico pensando em como alguém rouba LIVROS? Se alguém quiser lê-los, tudo bem, mas roubar o pobre bibliotecário? Muito azar. Abraços, JAIR.

Fátima disse...

Oi André,

Eu vi a reportagem, acharam a bicicleta, sem os livros.

Passando para te desejar um bom final de semana.

Beijo meu

Berzé disse...

Colocaria esse seu escrito tão bem urdido entre os "Por que acredito na Humanidade".
Parabéns André e toda força pro Robson.
Berzé

Artes e escritas disse...

Bibliotecas comunitárias e "rodantes" podem ajudar a dar um futuro a esses meninos e meninas. Um abraço, Yayá.

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